Em artigo publicado há pouco na Revista do Laboratório de Estudos da Violência da Unesp, o coronel da reserva Luiz Eduardo Pesce de Arruda defende mudanças na formação de policiais militares.
Para o coronel, que também é professor universitário e doutor em ciências policiais de segurança e ordem pública, os PMs só conseguirão se orientar pela prática dos direitos humanos em suas ações, como reivindicam parcelas expressivas da sociedade, quando as escolas em que são formados valorizarem a sua humanidade, em vez de desumanizá-los.
No artigo, intitulado Polícia e Direitos Humanos: A Responsabilidade das Escolas, o coronel sugere que não se pode esperar que os PMs passem a matar menos, quando, em sua formação, ainda jovens, são envolvidos por símbolos bélicos que louvam a letalidade; e comparados a animais agressivos como cobra, tigre e cachorros da raça pit bull.
O especialista também observa que as escolas utilizam canções e gritos que exaltam a guerra e o combate ao inimigo. Eles seriam adequados às Forças Armadas, mas não à PM, obrigada permanentemente a interagir com pessoas às quais serve e protege.
Arruda lista uma série de mudanças que poderiam ser feitas nas escolas de formação para se evitar o que chama de “atos de barbárie”, entre eles a morte de inocentes confundidos com delinquentes.
O primeiro passo seria o aprimoramento do processo seletivo. Quando a instituição opta por quantidade e não pela qualidade dos candidatos, abre “perigosas brechas, pelas quais poderão ser admitidas pessoas ansiosas, imaturas ou com transtornos de comportamento que estarão mais propensas à prática de atos reprováveis”.
O segundo passo sugerido é a valorização dos direitos humanos em cada momento da formação do policial. Para ele, mais importante do que ensinar a agir dentro dos limites da legalidade, é instar o jovem a “acreditar sinceramente, defender e promover os direitos humanos, mesmo em ambientes hostis”.
As instalações das escolas também deveriam mudar. “Como formar policiais em instalações improvisadas, medíocres, sujas, quebradas, desconfortáveis?” – pergunta. “Em escolas que são verdadeiras ilhas fortificadas, onde a comunidade não frequenta?”
Ainda sobre o ambiente, o coronel considera “imprescindível a abolição de símbolos bélicos que louvem a letalidade, glamourizem a morte, edulcorem a guerra ou seus instrumentos (fuzil, faca na caveira, etc)”.
Outro passo importante seria o fim do sistema de formação que leva à despersonalização do estudante, à perda de identidade e à aceitação passiva de humilhações e constrangimentos de todo gênero. Arruda observa que se o aluno é submetido a tratamento cruel, desumano ou degradante, tende a reproduzir esse tipo de comportamento nas ruas.
Ele defende ainda o fim da endogenia, ou seja: o fim do conceito de que o corpo docente seja “composto exclusivamente por profissionais da instituição, a linguagem padronizada, a visão de mundo acabada e unilateral, a simplificação da realidade”. A formação deveria incluir docentes de fora da instituição, “capazes de expressar ao aluno as contradições da própria sociedade” e ensiná-lo a “lidar com opiniões diversas das suas”.
O coronel defende a existência da instituição e critica os seus detratores. O que propõe são mudanças internas.
Ele apresenta o artigo como análise cotejada com um texto clássico de Theodor Adorno, Educação Após Auschwitz. Nele, o filosófo alemão trata a educação como preventiva a atos de barbárie como os que se viram no campo de concentração mantido pelos nazistas em Auschwitz, no qual foram mortos cerca de três milhões de judeus. Muitos dos policiais que lá trabalharam eram jovens camponeses que alegaram estar cumprindo ordens.
A íntegra do artigo de Arruda na revista da Unesp está disponível na internet.
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